quinta-feira, março 16, 2006

Aqui entre nós...

“(…) Hão te convencer de que a culpa é tua e tu sem culpa nenhuma, tens tu a ver, tens tu a ver com isso, não é filho? Cada um que se vá safando como puder, é mesmo assim, não é? Tu fazes como os outros, fazes o que tens a fazer, votas à esquerda moderada nas sindicais, votas no centro moderado nas deputais, e votas na direita moderada nas presidenciais! Que mais querem eles, que lhe ofereças a Europa no natal?! Era o que faltava! É assim mesmo, julgam que te levam de mercedes, ora toma, para safado, safado e meio, né filho? Nem para a frente nem para trás e eles que tratem do resto, os gatunos, que são pagos para isso, né? Claro! Que se lixem as alternativas, para trabalho já me chega. Entretém-te meu anjinho, entretém-te, que eles são inteligentes, eles ajudam, eles emprestam, eles decidem por ti, decidem tudo por ti, se hás-de construir barcos para a Polónia ou cabeças de alfinete para a Suécia, se hás-de plantar tomate para o Canada ou eucaliptos para o Japão, descansa que eles tratam disso, se hás-de comer bacalhau só nos anos bissextos ou hás-de beber vinho sintético de Alguidares-de-Baixo! Descansa, não penses em mais nada, que até neste país de pelintras se acho normal haver mãos desempregadas e se acha inevitável haver terras por cultivar! Descontrai baby, come on descontrai, arrefinfa-lhe o Bruce Lee, arrefinfa-lhe a macrobiótica, o biorritmo, o euroscópio, dois ou três ofeneologistas, um gigante da ilha de Páscoa e uma Grace do Mónaco de vez em quando para dar as boas festas às criancinhas!(…)”*

Este texto parece tão actual não é? Mas não é, foi escrito por José Mário Branco em 1979. O que é que mudou desde então? Notam evoluções de lá para cá? Afinal o que se fez desde o 25 de Abril até hoje?
Já vem do tempo da ditadura a excelente medida de entreter o povo com Futebol, com peregrinações a pé ou televisivas a Fátima ou ao som do Fado. O Fado, infelizmente, entrou em declínio, Fátima vai-se perdendo ao longo das gerações mas o futebol... O futebol é óptimo para adormecer, não há revoluções que resistam. Quanto ao resto, é ler e comparar! Dá que pensar…

*Excerto retirado do texto FMI editado originalmente em 1982, e reeditado em 1996 em Ser Solidário.

quinta-feira, março 09, 2006

Ai Portugal, Portugal...

Portugal, um país com bastantes tradições bem características, rico em paisagem natural, com uma temperatura de fazer inveja a muitos países cinzentos, e com uma riquíssima variedade de espécies animais, ou seja, com tudo para ser um pais rico e desenvolvido, é nos dias de hoje, um país pobre e pequeno, praticamente de 3º mundo que está na cauda da Europa. A paisagem natural vai ardendo de ano para ano, e a maior parte das espécies animais já está extinta.
Portugal é um país que abandona a sua riqueza cultural para adoptar as culturas de outros países, celebrando com muito gosto e alegria um Carnaval à brasileira, um dia de S. Valentim americano e um Natal Coca-Cola que nada tem a ver com a sua original base cristã, adoptando um Natal tipicamente pertencente aos Estados Unidos da América, país que a nível histórico pouco ou nada tem para contar. Assim como abandona a sua riqueza cultural, abandona também a sua riqueza linguística. Embora tenhamos uma das línguas mais bonitas, complexas e de maior riqueza gramatical, nos dias de hoje é bem mais fashion usar termos estrangeiros, geralmente termos ingleses. Sendo que estes aparecem em frases sem sequer serem postos entre aspas (era o mínimo!), é como se fizessem parte natural do nosso vocabulário. E é comum nas empresas observar os grandes empresários nas suas importantes reuniões falarem com toda a convicção em fazer brainstorming ou refreshings, out sourcing ou franchising, resta saber se dominam assim tão bem o português. É que pelo menos os jovens, que tanto insistem em usar o inglês, principalmente na Internet mesmo quando apenas se estão a comunicar com portugueses, não parecem ter qualquer conhecimento sobre a própria língua, dando erros dignos de rir ou chorar, dependo da prespectiva, quando fazemos o resumé dos resultados das provas globais de português.
Que actualmente não nos dêmos ao trabalho de traduzir as expressões que vêm de fora ainda vá (por muito mau que seja), agora substituir as expressões portuguesas por inglesas é que custa a perceber. Deixamos por exemplo de ver toneladas de novelas brasileiras em horário nobre para passar a ver toneladas de novelas brasileiras e portuguesas (de qualidade duvidosa) em prime-time. Mas infelizmente o uso de termos estrangeiros não fica por aqui, os politicos, os intelectuais, os homens com poder financeiro, todos passaram a usar estrangeirismos com tanta frequência como a que falam e aparecerem na televisão, e depois culpamos os jovens por não saberem falar português. Eles não sabem, é verdade, mas afinal de quem é a culpa?
Resta-nos os campeonatos europeus e mundiais de futebol para nos fazer lembrar que somos portugueses. Não somos Brasileiros nem Espanhóis, não. Somos portugueses, falamos português e temos a nossa própria cultura, pelo menos por enquanto…